Minhas avós e meus abacates


Hoje, muito honrada, começo a escrever uma coluna em A VOZ DA SERRA sobre a literatura infantojuvenil, direcionada aos agentes de leitura, ou seja, aos pais, avós, professores, bibliotecários ou aos que orientam as crianças e jovens à leitura.
A literatura me sensibiliza desde pequena, quando escutava minhas avós contarem histórias. Fui privilegiada. Tive três avós que me mostraram o encantamento das histórias, cada uma do seu jeito. Com elas, viajei por diferentes e interessantes universos, que me estimularam quando adulta a criar outros.
Minha avó italiana, mãe do meu padrasto, tinha o apelido de Minussa e até hoje não sei se Minussa era escrito com ss ou ç. Mas isso nunca me importou. O que ela me deixou foram histórias. Ao escutá-la, pronunciando as palavras com sotaque, conheci príncipes, castelos e dragões. Já a mãe do meu pai, a vovó Vera, costumava fazer balas de coco, contando fatos de sua vida de criança numa fazenda em Conservatória, RJ. E eu, sentada num banquinho ao lado da pia imaginava as tantas situações que viveu, como construía seus brinquedos com gravetos e tecidos. E a vovó Carmem, mãe da mamãe, traduzia pequenos romances espanhóis com a máquina de escrever, que hoje não se usa mais. Eu, já adolescente, gostava de escutar o bater das teclas e mais ainda de lê-los, depois que eram publicados.
Quando meus filhos eram pequenos, tive a oportunidade de vivenciar de novo a minha infância tão cheia de brincadeiras e observar a capacidade que eles tinham de desvendar o mundo com os olhos curiosos e arteiros, os quais me apontaram caminhos que minha escrita seguiu.
Depois que estudei e entrei na maturidade duas vontades influenciaram meu trabalho de escritora. A primeira foi decorrente do imenso prazer em escrever para crianças e jovens, muito mais do que qualquer outro texto literário. Se bem que a sensação de liberdade me invade sempre que escrevo uma crônica e as palavras saem de mim com facilidade, como se fossem participar de uma festa na folha de papel em branco, o maior desafio para um escritor.
A segunda vontade foi inspirada pelos abacates: ler bons livros.
O abacate, fruto de cor bela e polpa macia, é gostoso de saborear; os melhores precisam estar maduros e serem escolhidos dentre tantos. E o abacateiro para dar frutos saudáveis necessita de terra adubada, sol e chuva. E tempo.
Os abacates são como as histórias. Seu texto é feito por alguém que cria enredos, com personagens e o desenrolar dos fatos, que vai tecendo suas ideias através das palavras de modo a envolver o leitor.
As histórias que trazem valores constroem pessoas. Fazem pensar. Promovem mudanças. Deixam mensagens que podem ser guardadas e usadas na vida. Podem contar fatos simples, presentes no quotidiano, e quando lidas respaldam a experiência existencial. Como “Avó com Cheiro de Pão Caseiro”, editora Zit, em que Zé Zuca aborda o amor em idade avançada, ao descrever o espanto de um menino de onze anos, o Lúcio, que descobre que sua avó tem um namorado, o padeiro. Um livro delicioso de se ler.
Livros alimentam pensamentos e abacates, o corpo.
É, assim, com este modo de pensar que vou escrever a coluna.
Espero que gostem!
Tereza Malcher
Mestre em Educação (PUC-RJ), escritora de livros infanjuvenis, membro efetivo da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do prêmio OFF FLIP DE LITERATURA - Festa Literária Internacional de Parati.
*Publicado originalmente em A Voz da Serra, em 28 de junho de 2015.

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